O governo colombiano é hoje um agente da política imperial norte-americana no continente. Na Colômbia se desenvolve o único foco das “guerras infinitas” do governo dos EUA na América Latina. É o país que segue apresentando o maior número de desaparições de dirigentes sindicais e do campo popular em geral. O país onde há acintosamente presença de tropas norte-americanas operando no seu território.
É o país que recebe a maior “ajuda” militar dos EUA na região, que tem o maior numero de oficiais e soldados treinados naquele país para. É o único país que atacou, nestes anos, com suas tropas e aviões, território de um pais vizinho – o Equador. É o país que tem questionada a legitimidade do mandato presidencial, seja pelas vinculações conhecidas de Álvaro Uribe com para-militares e narcotraficantes, denunciadas e não contestadas na sua trajetória política, seja porque, por confissão dos acusados, conseguiu reformar a constituição colombiana para obter um terceiro mandato com votos comprados.
Como correlato disso tudo, o governo colombiano trata de propagar um clima de guerra fria na região, uma região que dá passos firmes nos processos de integração, de construção de estruturas energéticas comuns, de um Conselho Sul-Americano de Segurança.
A Colômbia funciona como porta-voz e agente das políticas de Washington na região, que buscam dividir os governos, militarizar os conflitos, gerar e multiplicar as tensões, reintroduzir o clima de guerra fria que havia imperado há décadas em todo o mundo.
Como arma dessas políticas belicistas e divisionistas - pontas de lança dos EUA no região -, o governo de Uribe passou, nos últimos tempos, a utilizar suposto material de um computador que alega ter obtido, para lançar suspeitas e acusações sobre presidentes, ministros e outros membros de governos latino-americanos, hipoteticamente vinculados às Farc. Mais recentemente, a revista Cambio – da família do Ministro da Defesa da Colômbia – voltou a lançar acusações sobre membros do governo brasileiro, com materiais que só lhe poderiam chegar do governo de Uribe, que com uma mão participa de contatos de pacificação na área e com a outra segue fomentando, sem nenhuma prova publica, calunias e difamações.
O governo brasileiro não deve permitir que esse tipo de acusações siga sendo feito, deve fazer saber ao governo colombiano que não seguirá tolerando esse tipo de atitude provocadora e belicista do governo colombiano, que seguirá respeitando os assuntos internos da Colômbia, que seguirá colaborando com as eventuais novas tratativas publicas para a troca de prisioneiros e reféns, mas exige que o governo colombiano cesse com esse tipo de atitude irresponsável.
Por outro lado, aqui mesmo, membros das FFAA brasileiras, incomodados com que os Ministros Tarso Genro e Paulo Vannuchi tenham retomado o tema das responsabilidades pelo hediondo crime de tortura – praticado – e confessado publicamente em vários casos – por militares durante a ditadura, vêm a público manifestar sua “revolta” contra suposta “conduta revanchista”. Fazem seminário no Clube Militar – de triste memória como antro de articulações golpistas desde os tempos de Getúlio – para discutir o que chamam de “passado terrorista” de membros do governo e do PT.
Alegam, entre outras coisas: “Será que quem seqüestrou o embaixador norte-americano e o prendeu, dizendo todo dia que ia matá-lo, não cometeu ato de tortura igualmente condenável?” Bom saber que implicitamente, os autores da afirmação – publicada no Estado de São Paulo de 4/8/2008 – consideram condenável a tortura, praticada sistematicamente como política de Estado pelo regime militar, que pela força destituiu um governo democraticamente eleito pelo povo brasileiro e instaurou um regime ilegítimo, apoiado na violência exercida por setores das FFAA, com os instrumentos que a cidadania havia depositado nas suas mãos para defender a soberania nacional e não para atacar a democracia.
É preciso recordar que o seqüestro do embaixador norte-americano e os outros praticados pelos grupos clandestinos da época – aos quais pertenceram notoriamente membros atuais do governo, defendendo a democracia, atacada então pelas FFAA e pela direita civil, apoiada confessadamente pelo governo dos EUA – conseguiram, sem nenhuma vítima fatal, tirar dos calabouços da ditadura, onde estavam submetidos à tortura e com riscos evidentes de vida, a várias dezenas de militantes da resistência democrática.
Ações como aquelas, legitimidas pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, como o direito de rebelião contra as tiranias – foram realizadas na defesa da democracia e contra a ditadura, exercida por altos mandos das FFAA.
Como declarou, de forma digna e corajosa a Ministra Dilma Roussef recentemente no Senado, diante da interpelação de um dos tantos políticos civis participantes da ditadura militar e – portanto, conivente com as torturas, pelo menos por nunca ter feito autocrítica dessas praticas do regime a que pertencia -, ela e tantos outros brasileiros foram vitimas de prisões arbitrárias, de selvagens torturas, muitos foram assassinados, lutando pela restauração da democracia, que finalmente o povo brasileiro conseguiu impor, depois de tantos sacrifícios.
Não se pode igualar verdugos e vítimas, como fez a Lei da Anistia, imposta pela ditadura. Do que se trata não é de “revanchismo”, mas de fazer o que fez a África do Sul, sob a direção do Premio Nobel da Paz, o arcebispo Desmond Tutu: apurar a verdade do que passou, único caminho para virar definitivamente essa página ignominiosa da história brasileira que foi a ditadura militar.
Fonte: Emir Sader
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