Professor da American University e consultor do centrista Brookings Institution, Yarrow vai além e propõe o estabelecimento de uma nova era, calcada na imagem dos presidentes de Brasil, França e EUA. "Prestando atenção no simbolismo político dos três estadistas, vê-se que o mundo democrático está entrando em um novo período, tão definitivo e transformador quanto o pacto social-democrático de Franklin Delano Roosevelt após a Segunda Guerra Mundial, o chamado Consenso Liberal, ou a Ascensão Conservadora das últimas três décadas, marcadas pelas políticas de Ronald Reagan e Maragareth Thatcher", escreve.
Para o historiador, que deixou a reportagem do The New York Times para investir na vida acadêmica, completando a pós-graduação Universidade de Harvard e trabalhando no governo Bill Clinton, o comprometimento com a Justiça Social dos três líderes está um passo à frente da Terceira Via de Clinton e Tony Blair, representada no Brasil pelo governo de Fernando Henrique Cardoso. O cerne do sucesso dos três líderes, diz Yarrow, está na idéia de compaixão social condicionada à responsabilidade pessoal - no Brasil, com as contrapartidas exigidas pelo Bolsa Família, nos EUA, com o discurso de Obama voltado para o ativismo social dos mais abastados e a necessidade de a comunidade afro-americana voltar a investir nos valores de fortalecimento familiar - e em uma visão internacionalista comprovada pela movimentação de Paris e Brasília durante a mais recente crise no Oriente Médio, trabalhando ativamente por uma trégua entre Israel e os palestinos.
O Terra conversou com o professor da American University sobre sua previsão de que os próximos anos no mundo ocidental serão moldados pela ação de Lula, Obama e Sarkozy. Yarrow só não quis emitir opinião sobre a sucessão presidencial no Brasil, tema que acompanha de longe e com enorme atenção - a se julgar por seus questionamentos sobre a possível candidatura da ministra Dilma Roussef em 2010.
O senhor diz que o Lula, Obama e Sarkozy desafiam, cada um a seu modo, a política convencional. Pode explicar melhor esta sua observação?
Lula, Obama e Sarkozy são, os três, líderes políticos pós-partidários. Eles combinam um comprometimento com a inclusão e a justiça social com um crescimento econômico que beneficie ao mesmo tempo trabalhadores e empresários. Eles refutam os moribundos modelos advindos do "Consenso de Washington", o capitalismo neo-liberal pós-Reagan e Thatcher, calcado na desregulamentação dos mercados. Mas também não são estatizantes per se, não se aproximam de modelos socialistas tal qual os conhecemos. Lula com o PT, Obama com os Democratas, e Sarkozy com os gaullistas e os democrata-cristãos, estabeleceram rupturas com as culturas políticas mais características de seus grupos partidários.
O senhor fala do Consenso Liberal dos anos 30 e da Revolução Conservadora dos 70-80. O que esperar da era de Lula-Obama-Sarkozy?
A era de Lula-Obama-Sarkozy é marcada por um retorno, em âmbito interno, das políticas de crescimento econômico emparelhadas com a busca de Justiça Social. Os três também representam, não apenas através de seus atos, mas por suas próprias trajetórias de vida, um mundo mais multi-cultural, mais globalizado. Em política externa, talvez menos com Obama, embora ele tenha se comprometido com a tese durante a campanha eleitoral, os três são arquitetos de um novo internacionalismo, que acredita na intervenção em casos de emergências humanitárias, em casos de genocídio e grandes epidemias, por exemplo.
O senhor diz também que os três são "figuras ultra-públicas". Pode explicar melhor esta idéia?
Lula, Obama e Sarkozy são três figuras extremamente carismáticas. E, embora manchados um pouco por problemas relacionados às suas atividades pessoais, especialmente o líder francês, os três restauraram a fé na vida pública e fizeram com que os cidadãos de seus países acreditassem na eficácia do governo novamente. Obama e Lula, particularmente, inspiram esperança e conseguiram trazer para o tabuleiro político parcelas do eleitorado que não tinham voz em seus respectivos países. E os três são figuras públicas dispostas a atos dramáticos, que chamam atenção para aspectos críticos tanto de situações internas quanto de crises internacionais.
Quando o senhor fala de Lula em seu artigo, um dos destaques é a noção de 'responsabilidade condicional' colocada novamente na mesa a partir da fórmula do Bolsa Família. Por que acredita que este aspecto é tão fundamental na consolidação do fenômeno Lula?
É a idéia de que, não esquecendo que o governo deve ajudar a incrementar o bem-estar da população, e provê-los segurança, os indivíduos devem assumir uma maior responsabilidade pessoal pelas suas vidas. Lula e Obama defendem um novo contrato social - diferente tanto do liberal do pós-guerra quanto do consenso conservador dos anos 80 - que oferece um balanço entre as responsabilidades do Estado e as do cidadão comum.
Como o senhor definiria cada um destes três líderes que, de acordo com o senhor, estariam redefinindo ideologicamente o mundo ocidental?
Lula, Obama e Sarkozy são homens que chegaram à liderança política emergindo de áreas distantes das elites tradicionais de Brasil, Estados Unidos e França. Eles chegaram ao poder através de seu carisma, da capacidade de fazer com que a população acreditasse em seus esforços em relação a melhoria da vida em seus países, e da coragem de abraçarem novas filosofias, calcadas em extraordinária capacidade de organização e mobilização política.
Fonte: Terra, por Eduardo Graça
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