Ulisses Capozzoli
A discussão recente (na verdade ela se arrasta há anos) envolvendo exigência de diplomas para jornalismo é o tipo de questão em que não se pode, mecanicamente, se declarar a favor ou contra, sem outras considerações.
O ataque sistemático contra o diploma tem partido especialmente do jornal Folha de S. Paulo, com o argumento, entre outros, de que foi uma decisão da ditadura militar.
Mas a implantação do Fundo de Garantia também foi uma solução da ditadura militar. E por que a Folha não se coloca contra a adoção do Fundo de Garantia?
A resposta é óbvia, ainda que a argumentação, em casos como este, costume passar por discursos envolvendo a “modernização” das relações de trabalho entre outras considerações.
Suspeito também a Folha se apegar tanto ao argumento de “solução da ditadura” porque, à época do governo dos generais, a Folha não tinha editorial. Ou seja, não manifestava a sua opinião, corroborando a versão popular do “quem cala consente”.
E isso sem considerar que o grupo Folhas, a que a Folha de S. Paulo pertence, tinha duas publicações sintomáticas, no sentido freudiano do termo.
Uma delas era a simplesmente horrorosa Notícias Populares, a versão mais repugnante do chamado “mundo cão”.
A outra era a Folha da Tarde, jornal francamente identificado com a ditadura militar que, agora, a Folha de São Paulo pretende caracterizar como nefasta.
Se não convence leitores mais críticos, a Folha ao menos conquista a parcela do estilo “me engana que eu gosto”, um tipo de gente que escreve cartas aos jornais apoiando o que quer que seja, ou desaprovando, não faz diferença.
O que a Folha pretende, na verdade, é dispor do que no passado foi chamado de “exército industrial de reserva”, e que hoje pode se entender como abundância de mão-de-obra, a custo baixo e submissa ao autoritarismo que caracteriza sua redação, uma das mais perversas da história do jornalismo.
Nesta semana o Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de seu presidente, o “deixa que eu chuto” Gilmar Mendes, anunciou o fim da exigência de diploma para jornalistas.
E Mendes, como é de seu estilo, trombeteou que essa é a solução final no caso.
Os atritos, próximo ao estilo briga de rua, que têm caracterizado o STF, sem falar dos transbordamentos egóicos que caracterizam parte de seus membros, combina com o estilo falastrão do ministro.
Em artigo publicado na Folha de ontem, no entanto (esse é o estilo de venda da imagem de modernidade do jornal) o advogado José Paulo Cavalcanti Filho colocou o assunto em termos inteligíveis e civilizados.
Não cabe, deixou claro Cavalcanti Filho, ao STF definir a obrigatoriedade ou não de diplomas para jornalistas (ou se meter na regularização/desregularização) de qualquer outra profissão.
Esse é um papel do Congresso Nacional, ainda que esse mesmo Congresso também venha nos dando espetáculos repetidos de atos constrangedores.
O fato, no entanto, e esse parece ser o centro da questão, é que por trás do fim do diploma para jornalistas não há qualquer pretensão de se elevar a qualidade do jornalismo brasileiro.
O buraco aqui, para fazer uso de uma expressão popular “é mais embaixo” e não tem relação com qualquer tipo de altruísmo ou coisas dessa natureza.
O interesse por trás do fim do diploma é simplesmente o barateamento da mão-de-obra e a elevada rotatividade profissional e essa é a ameaça que acompanha as frases feitas como as utilizadas pela Folha.
Qualquer telespectador de canais por assinatura pode constatar, em emissoras de países desenvolvidos, a quantidade de jornalistas veteranos envolvidos em coberturas, comentários e avaliações de fatos merecedores de abordagem jornalística.
Não é o que acontece no Brasil, onde a experiência profissional, a partir de certo momento, é mais identificada como ameaça, no sentido de resistência a atitudes indignas, que qualidade e isenção crítica sobre o que está em debate.
Dizer que a defesa do diploma caracteriza corporativismo é palavra de ordem, lógica fácil, uma forma de jogar areia nos olhos da sociedade.
Até porque a legislação atual aceita determinado percentual de jornalistas sem, obrigatoriamente, a exigência de diploma.
Na verdade, a regulamentação/desregulamentação da profissão de jornalismo, acompanhada de várias outras atividades, mereceria uma discussão pragmática, articulada com uma realidade nacional mais ampla e crítica.
Mas isso denunciaria interesses imediatos camuflados por trás de palavras de ordem, a lógica fácil que, especialmente críticos menos exigentes, tendem a aceitar como o equivalente da verdade.
Fonte: Revista Scientific American Brasil
A discussão recente (na verdade ela se arrasta há anos) envolvendo exigência de diplomas para jornalismo é o tipo de questão em que não se pode, mecanicamente, se declarar a favor ou contra, sem outras considerações.
O ataque sistemático contra o diploma tem partido especialmente do jornal Folha de S. Paulo, com o argumento, entre outros, de que foi uma decisão da ditadura militar.
Mas a implantação do Fundo de Garantia também foi uma solução da ditadura militar. E por que a Folha não se coloca contra a adoção do Fundo de Garantia?
A resposta é óbvia, ainda que a argumentação, em casos como este, costume passar por discursos envolvendo a “modernização” das relações de trabalho entre outras considerações.
Suspeito também a Folha se apegar tanto ao argumento de “solução da ditadura” porque, à época do governo dos generais, a Folha não tinha editorial. Ou seja, não manifestava a sua opinião, corroborando a versão popular do “quem cala consente”.
E isso sem considerar que o grupo Folhas, a que a Folha de S. Paulo pertence, tinha duas publicações sintomáticas, no sentido freudiano do termo.
Uma delas era a simplesmente horrorosa Notícias Populares, a versão mais repugnante do chamado “mundo cão”.
A outra era a Folha da Tarde, jornal francamente identificado com a ditadura militar que, agora, a Folha de São Paulo pretende caracterizar como nefasta.
Se não convence leitores mais críticos, a Folha ao menos conquista a parcela do estilo “me engana que eu gosto”, um tipo de gente que escreve cartas aos jornais apoiando o que quer que seja, ou desaprovando, não faz diferença.
O que a Folha pretende, na verdade, é dispor do que no passado foi chamado de “exército industrial de reserva”, e que hoje pode se entender como abundância de mão-de-obra, a custo baixo e submissa ao autoritarismo que caracteriza sua redação, uma das mais perversas da história do jornalismo.
Nesta semana o Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de seu presidente, o “deixa que eu chuto” Gilmar Mendes, anunciou o fim da exigência de diploma para jornalistas.
E Mendes, como é de seu estilo, trombeteou que essa é a solução final no caso.
Os atritos, próximo ao estilo briga de rua, que têm caracterizado o STF, sem falar dos transbordamentos egóicos que caracterizam parte de seus membros, combina com o estilo falastrão do ministro.
Em artigo publicado na Folha de ontem, no entanto (esse é o estilo de venda da imagem de modernidade do jornal) o advogado José Paulo Cavalcanti Filho colocou o assunto em termos inteligíveis e civilizados.
Não cabe, deixou claro Cavalcanti Filho, ao STF definir a obrigatoriedade ou não de diplomas para jornalistas (ou se meter na regularização/desregularização) de qualquer outra profissão.
Esse é um papel do Congresso Nacional, ainda que esse mesmo Congresso também venha nos dando espetáculos repetidos de atos constrangedores.
O fato, no entanto, e esse parece ser o centro da questão, é que por trás do fim do diploma para jornalistas não há qualquer pretensão de se elevar a qualidade do jornalismo brasileiro.
O buraco aqui, para fazer uso de uma expressão popular “é mais embaixo” e não tem relação com qualquer tipo de altruísmo ou coisas dessa natureza.
O interesse por trás do fim do diploma é simplesmente o barateamento da mão-de-obra e a elevada rotatividade profissional e essa é a ameaça que acompanha as frases feitas como as utilizadas pela Folha.
Qualquer telespectador de canais por assinatura pode constatar, em emissoras de países desenvolvidos, a quantidade de jornalistas veteranos envolvidos em coberturas, comentários e avaliações de fatos merecedores de abordagem jornalística.
Não é o que acontece no Brasil, onde a experiência profissional, a partir de certo momento, é mais identificada como ameaça, no sentido de resistência a atitudes indignas, que qualidade e isenção crítica sobre o que está em debate.
Dizer que a defesa do diploma caracteriza corporativismo é palavra de ordem, lógica fácil, uma forma de jogar areia nos olhos da sociedade.
Até porque a legislação atual aceita determinado percentual de jornalistas sem, obrigatoriamente, a exigência de diploma.
Na verdade, a regulamentação/desregulamentação da profissão de jornalismo, acompanhada de várias outras atividades, mereceria uma discussão pragmática, articulada com uma realidade nacional mais ampla e crítica.
Mas isso denunciaria interesses imediatos camuflados por trás de palavras de ordem, a lógica fácil que, especialmente críticos menos exigentes, tendem a aceitar como o equivalente da verdade.
Fonte: Revista Scientific American Brasil
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