segunda-feira, abril 28, 2008

Caso Isabella: êxito comercial explica espetáculo

Aqueles que criticam a transformação, pela mídia, da cobertura da morte da menina Isabella Nardoni em um espetáculo, geralmente se lembram dos erros graves dos meios de comunicação nos casos da Escola Base e do Bar Bodega, entre outros, e concluem que a mídia não aprende. A verdade é outra: a mídia não quer aprender. Isso exigiria tornar cuidadosa, justa e não sensacionalista a cobertura, o que subverteria a lógica dos seus interesses comerciais.

Alega-se que não há como a mídia resistir à força do mercado, que seria neutro e abstrato, já que constituído por uma massa de consumidores capazes de ditar à mídia o que esta deve produzir. Não é bem isso. Em um universo de informação dominado, no Brasil e no mundo, por monopólios e oligopólios de mídia, a concorrência é muito restrita. O resultado é que as alternativas de informação disponíveis para o público são cada vez mais limitadas.

Na prática, o mercado é muito menos o resultado do poder do consumidor de informações do que do poder das empresas de mídia. Estas, assim como as dos demais setores econômicos, têm como objetivo central a busca do lucro. O aumento da penetração da mídia com a cobertura da tragédia, divulgado nas últimas semanas, trouxe ampliação de faturamento. Essa é a principal explicação para o rumo que a cobertura tomou.

Essa cobertura visa manter, pelo maior tempo possível, o máximo de carga emocional nos veículos de comunicação, porque isso significa manter o público cativo e prolongar a safra de maior faturamento. Essa estratégia é a explicação para o atropelamento da presunção da inocência das pessoas supostamente envolvidas na morte da menina e das normas básicas de checamento de informações, entre outras.

Diante da pressão avassaladora da mídia e de um público mantido incapaz de lhe fazer a crítica - já que depende desses próprios meios para criticá-los -, outras instituições se rendem. O desrespeito do segredo de justiça, o comprometimento de provas, a inércia do Estado em situações de flagrante ameaça a integridade de suspeitos e de não suspeitos compõem um quadro de violação de regras da sociedade democrática.

Tudo leva a crer que, enquanto o faturamento continuar elevado, a mídia prosseguirá produzindo julgamento prévio e sensacionalismo em vez de informar com base em critérios jornalísticos e com respeito à Justiça e à democracia. O espetáculo é a base de um êxito comercial que não se quer interromper.

Essa é a regra geral, confirmada pela exceção honrosa dos veículos críticos e dos profissionais sérios que não compactuam com as mazelas da cobertura que humilha o interesse público e serve de modo exclusivo e desmesurado ao interesse privado.

Fonte: Carlos Drummond , De Campinas (SP), no Terra Magazine

Nenhum comentário: