segunda-feira, novembro 15, 2010

Carta ao filósofo da UNICAMP: Interpretação da Escola de Copenhaque

Texto do professor Fernando Lang (2006) para um filósofo da UNICAMP, interessado na interpretação de Copenhagen e que acreditava ser essa interpretação "realista".

 Recebi por email.


Sent: Sunday, January 22, 2006 12:10 PM

Subject: A Interpretação de Copenhague é não-realista!


  Caro Jose Oscar






A Interpretação da Escola de Copenhaque (IEC) foi apresentada pela primeira vez no Congresso Solvay de Bruxelas em 1927 por Bohr, Born, Heisenberg, Pauli e Dirac. De imediato passou a ser criticada por diversos físico de renome, entre eles Schrödinger, De Broglie (este posteriortmente adere à EC e mais adiante rejeita novamente), Lorentz, Einstein e Planck.

A IEC é consistente com a filosofia do Positivismo Lógico, então no auge do seu vigor, adotando as teses fenomenista (o objeto físico não tem existência independente do observador) e empirista do Círculo de Viena. Vou te destacar alguns aspectos que são indicadores do caráter não-realista, idealista da IEC:

1) A MQ não se refere aos entes quânticos em si mas ao que se pode observar dos entes quânticos.

2) Os entes quânticos exibem um caráter dual, podendo se apresentar (!!) como ondas ou como partículas dependendo da situação experimental. Novamente, a MQ não se pronuncia sobre os entes quânticos em si mas sobre como os entes quânticos podem se apresentar a um observador; portanto a MQ não trata da coisa-em-si mas do fenômeno.

3) As relações de Heisenberg são denominadas de Princípio da Incerteza. Incerteza é um estado mental, descreve uma condição do nosso conhecimento sobre as coisas, não é uma propriedade das coisas em si.

5) O quadrado da função de onda em um ponto é a densidade de probabilidade de se medir ou se observar o ente quântico naquele ponto.

6) Os autovalores de um operador que corresponde a uma variável dinâmica são os possíveis valores medidos (!!) para a variável dinâmica. A própria variável dinâmica é denominada de "observável".

7) O colapso da função de onda segundo vou Neumann ocorre na consciência do observador. O mundo somente funciona quando alguém o observa!!

Como bem sabes os materialistas dialéticos não toleram o idealismo. Na URSS diversos físicos importantes queriam adotar IEC e a adotaram (o mais conhecido deles era Fock); para tanto tiveram que travesti-la com a linguagem do materialismo dialético (por exemplo, a dualidade onda-partícula mostra o caráter dialético da natureza e o Princípio da Incerteza foi rebatizado por Princípio da Indeterminação). Fock tentou diversas vezes levar Bohr a Moscou mas isto não foi permitido pelo partido pois os ideólogos comunistas tinham bem claro que Bohr professava uma filosofia intolerável para os marxistas. Somente nos anos 50 é que finalmente Bohr pode ir a Moscou.

Einstein era uma realista e um determinista (Deus não joga dados!). Tinha objeções a MQ por causa do seu caráter probabilista. Um determinista somente pode aceitar enunciados de probabilidade como consequência da sua falta de conhecimento (interpratção subjetivista para a probabilidade). Assim a MQ, por ser uma teoria probabilista, não falava do mundo em si como deseja um realista. Desta forma a MQ seria no futuro substituída por uma teoria mais profunda de caráter determinista. Einstein também não tolerava a tese de que a MQ era o fim do caminho (tese defendida pela EC, especialmente por Bohr); para ele todas as teorias são provisórias e serão substituídas por outras. Inspirou Bohm a produzir a primeira "teoria de variáveis ocultas" para explicar a MQ.

Para uma excelente exposição do caráter subjetivista da IEC pode-se consultar por exemplo Karl Popper (A teoria dos quanta e o cisma da Física), Mario Bunge (Filosofia da Física, Controversias en física, Racionalidad y realismo), Franco Selleri (Paradoxos e Realidade). Tanto Popper quanto Bunge defendem interpretações realistas-probabilistas para a MQ. Franco Selleri é um físico que trabalha em fundamentos da MQ e defende uma interpretação realista inspirada no "dualismo objetivo de De Broglie". Um excelente livro sobre as interpretações da MQ é o do teu colega Osvaldo Pessoa Jr. (Conceitos de Física Quântica).



  Abraços


  Fernando

http://www.if.ufrgs.br/~lang/


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