quinta-feira, agosto 24, 2006

A ESTRATÉGIA DE FOGAÇA E O CASO DE ALCKMIN

Vejam como deram o GOLPE para assumir a prefeitura de Porto Alegre (relato de alguém que conhece)

23.08, 17h55
por Paulo G. M. de Moura, cientista político

Nos últimos artigos que escrevi aqui, confrontei os argumentos daqueles que defendem que Alckmin deveria largar batendo duro em Lula. Tomei como base para defesa de meu ponto de vista as similaridades entre o paradigma estrutural da disputa presidencial em curso e seu equivalente em Porto Alegre. A capital gaúcha foi governada pelo PT por 16 anos seguidos, até Tarso Genro perder a eleição de 2004 para o ex-senador José Fogaça.

O PT gaúcho já não tem mais a força que tinha na capital e no interior do estado. Mas, de 1994 até 2000, o PT vinha fazendo mais de 50% dos votos no primeiro turno em Porto Alegre, tanto nas eleições para governador como para prefeito. A análise das pesquisas revelava a existência de cerca de 35% de eleitores petistas convictos, cerca de 35% de eleitores antipetistas convictos, e cerca de 30% de eleitores centristas, que simpatizavam com o PT e lhe conferiram consistentes vitórias eleitorais sobre seus adversários nas eleições de 1994, 1996 e 1998 na capital gaúcha.

Em 2000, pela primeira vez um candidato petista foi forçado a ir ao segundo turno. Tarso Genro fez 48,5% dos votos válidos e teve de enfrentar Collares (PDT) que, com um discurso antipetista, largou batendo desde o primeiro dia de propaganda na TV e perdeu a eleição, fazendo cerca de 34% dos votos no segundo turno. Por que Tarso teve de enfrentar o segundo turno? Porque levou porradas duras da oposição no primeiro turno e porque o PT sofria o desgaste do governo Olívio Dutra. Mas, no segundo turno, enfrentando um candidato antipetista com alta rejeição, Tarso Genro venceu com cerca de 63% dos votos válidos.

O PT já sofria desgaste devido ao governo medíocre de Olívio Dutra no estado e seus então 12 anos à testa da prefeitura da capital, mas o eleitor de centro não quis trocar o PT pelo antipetismo, temendo perder aquilo que ele entendia que o PT fez de bom na prefeitura. Cerca de 40% dos eleitores queriam uma proposta nova, mas, ao contrário da oposição raivosa, não queria o fim do PT.

Na eleição de 2002 para governador, Britto largou batendo duro em Tarso Genro, que renunciara à prefeitura da capital para concorrer ao governo, tendo prometido que não o faria. Tarso respondeu duro também. A disputa entre ambos virou uma autêntica guerra de bugios (símio que briga atirando seus excrementos nos adversários). O eleitor rejeitou Britto e Tarso e deu a vitória a Rigotto, que correu por fora sem precisar bater em ninguém, já que Britto havia se encarregado de desmontar o PT e seu candidato. Hoje, no estado e na capital, o patamar de largada do PT é de cerca de 25% dos votos.

Como Fogaça derrotou o trotskista Raul Pont em 2004? Com uma estratégia centrista. As pesquisas indicavam a existência de vaso-comunicação entre os eleitorados de Fogaça e Pont. Isto é, as pesquisas indicavam que cerca de 50% dos eleitores de Fogaça votariam em Pont se o petista não estivesse concorrendo e que cerca de 30% dos eleitores de Pont migrariam para Fogaça na hipótese de o petista ficar fora da disputa. Os eleitores de centro indicavam que queriam uma proposta nova na prefeitura, mas não queriam o fim do orçamento participativo e de outras realizações do governo petista que entendiam positivas. Os estrategistas de Fogaça cunharam o slogan “Fica o que tá bom; muda o que não tá”. Fogaça venceu com um discurso de preservação das “conquistas” (argh!) dos governos do PT e de inovação naquilo que o PT foi incapaz de satisfazer os eleitores de centro.

Fogaça permaneceu com cerca de 16% das manifestações de intenção de voto nas pesquisas por mais de um mês. Em meados de setembro Fogaça foi à cerca 19% e Pont, que largou com cerca de 29%, chegou aos 35%. Na última semana do primeiro turno os eleitores antipetistas, que se distribuíam entre os diversos candidatos de oposição, começaram a migrar para Fogaça, elevando-o a cerca de 28%; antecipando o voto do segundo turno ao perceberem que o candidato do PPS seria o adversário do PT. Quando o segundo turno começou, Fogaça já havia ultrapassado Pont.

No intervalo entre um turno e outro meus amigos que trabalhavam com estrategistas de Fogaça me chamaram para opinar sobre a estratégia de segundo turno. Sem ver as pesquisas qualitativas deles, afirmei que achava difícil Fogaça vencer sem bater no PT, pois achava que o PT bateria duro em Fogaça. Felizmente eles não me ouviram. Decidiram não bater e apenas rebateram de forma competente, as mentiras do PT contra Fogaça. E venceram atraindo os votos dos eleitores de centro, que desde 1994 votavam nos petistas já no primeiro turno.

Nas hostes antipetistas, reinava o descontentamento com o discurso centrista de Fogaça, que não batia no PT para não desagradar os eleitores de centro. Fogaça venceu roubando o discurso do PT. Contribuíram para esse resultado, além da estratégia acertada de Fogaça, diversos fatores: o desgaste acumulado do PT no poder (governos de Porto Alegre, do estado e do Brasil); os erros do trotskista Pont, que fez um discurso “malufista” das grandes obras, estranho à cultura participacionista que o próprio PT incutiu nos porto-alegrenses, dentre outros.

Não existem duas eleições iguais. Muito menos se pode transferir automaticamente a situação e as circunstâncias de uma eleição municipal para o caso de uma eleição para presidente. No entanto, as similaridades da estrutura da disputa entre Lula e Alckmin com o caso de Porto Alegre em 2004, são muitas. O paradigma dos 3 terços do espectro eleitoral é idêntico; a penetração de Lula nos espaço do centro, também.

Ao perceber essas similaridades foi que mudei minha avaliação do cenário desta eleição. Quando prognostiquei a possibilidade de vitória de Alckmin em primeiro turno, achava que, diante da propaganda negativa da oposição, como o competente programa do PFL de junho na TV, o eleitorado de centro abandonaria Lula rapidamente. Isso não se confirmou. O eleitor de centro teme perder aquilo que percebe como realizações positivas do governo petista (bolsa-esmola, crescimento do poder aquisitivo devido à valorização do Real, etc.). Logo, se Alckmin quiser vencer, precisa convencer esses eleitores de centro de que não vai acabar com o que eles acham que Lula fez de bom, e vai corrigir o que Lula fez de ruim (possivelmente, omissão ou cumplicidade com a corrupção no governo).

Há diferenças entre a eleição de 2004 em Porto Alegre e a eleição presidencial em curso. Raul Pont nunca teve os patamares que Lula tem nas pesquisas e errou sua estratégia. Lula tem grandes chances de vencer no primeiro turno e está operando com muita competência sua estratégia. Entendo, portanto, que Alckmin precisará recorrer à propaganda negativa para tirar eleitores de Lula evitando a vitória antecipada de Lula. O risco de vitória de Lula em primeiro turno é que impõe o início da sua desconstrução antes do segundo turno. A questão é quando e como começar a desmontar Lula.

Suponho que a hora de desconstruir Lula chegará quando as pesquisas qualitativas indicarem que o eleitor de centro confia na palavra de Alckmin e acredita que ele, se eleito, não vai acabar com o “bolsa-esmola”. Suponho que a desconstrução da imagem do petista não poderá ser feita de forma virulenta para não agredir o eleitor de centro que gosta de Lula. O conteúdo central da propaganda negativa, tudo indica, é a corrupção no governo. A forma dessas peças (linguagem e formato) será tão o mais importante que o conteúdo. O fundamental é desmontar Lula de maneira a transferir seus eleitores para Alckmin. As pesquisas qualitativas vão indicar esse caminho. Parece-me que é necessário começar a desconstrução de Lula ainda no primeiro turno para barrar sua vitória em primeiro turno. Mas, o timing também é uma questão de sintonia fina. As pesquisas de tipo tracking diário e as qualitativas de tipo view facts, de monitoração da propaganda no ar em tempo real, é que vão indicar a hora de começar. Se começar o vazamento de eleitores de Lula para Alckmin, depois disso, teremos um indicador das suas chances. Se isso não acontecer ainda no primeiro turno; Lula vencerá.

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